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terça-feira, 3 de junho de 2014

Uma outra ilusão

                           Nos limites da inconsequência

    Já em São Paulo, comecei a trabalhar logo no segundo dia, estava empolgado com a possibilidade de ganhar bastante dinheiro, pensava em comprar um carro, conhecer a cidade em que nasci e tudo mais. A oficina ficava em um quintal onde também funcionava um estacionamento e, nos fundos a casa da proprietária do imóvel.


   Era uma senhora muito legal e rapidamente fizemos uma boa amizade. Eu a ajudava a consertar algumas coisas e a manobrar os carros no estacionamento. No começo as coisas pareciam que iriam dar certo, e até teria dado, se não fosse o fato de que eu não tinha mais controle sobre a minha adicção fazia tempo e, que em breve eu perderia de vez o juízo.

   No primeiro mês correu tudo bem, eu trabalhava todos os dias, não saia para lugar nenhum e era visto como um bom rapaz pela vizinhança. Já no segundo mês comecei a desandar, passei a beber todos os dias depois do trabalho, sendo que só parava de beber quando não conseguia mais parar em pé. Como sempre, no dia seguinte não tinha a menor condição de trabalhar.

   Ai começaram as primeiras discussões com meu pai, só que como ele não ficava um dia sem beber, também não tinha como me impedir. Mas até ai tudo bem, depois de uma boa bronca eu despertava e pegava no batente executando todo o meu trabalho

   Eu costumava ir todos os dias comprar cigarros em uma banca de jornais que ficava na rua de cima, nela trabalhava um carinha esquisito com cara de maluco mas que era gente fina e, logo éramos amigos. Conversávamos bastante, sobre tudo, inclusive sobre rock'in roll, pois tanto eu quanto ele ouvíamos apenas este estilo de música. Até que um dia ele comentou sobre uma banda da qual eu já ouvira falar, mas nunca tinha ouvido as músicas.

   Ele me disse que se eu gostava mesmo de rock precisava ouvir aquele som e, que depois disso eu não seria mais o mesmo. Ele estava certo. Então ele abriu uma gaveta e tirou de dentro uma fita de video velha e me deu dizendo; "pode ficar com ela pra você". E foi assim que eu conheci o que me faria ficar completamente louco. Na fita havia um adesivo escrito "THE DOORS" 

   No dia seguinte pedi para um amigo do meu pai para assistir a fita na casa dele, pois morávamos na oficina e lá não tinha video cassete. Para a minha alegria ele deixou e saiu me deixando sozinho. Tratava-se do filme que conta a história da banda californiana liderada pelo cara mais alucinado que e já tinha visto, Jim Morrison. 

  Naquele dia o tempo pareceu ter parado, eu fiquei completamente fascinado por aquelas músicas e por aquele sujeito imprevisível. Tamanho foi meu fascínio que assisti o filme três vezes seguidas, só não assisti pela quarta vez por que o dono da casa havia chegado e já era tarde da noite. Me lembro de ter ido dormir naquele dia com aquelas músicas na cabeça, eu ficava repetindo em voz baixa as frases citadas por Jim Morrison durante o filme.

  No dia seguinte já acordei com vontade de assistir o filme novamente, não pensava em mais nada a não ser em como conhecer mais sobre a vida do primeiro ídolo que tive na vida. Sem perceber me tornei devoto daquela banda, só falava sobre isso, eu queria ser Jim Morrison, até decidi deixar o cabelo crescer.

   Consequentemente, isso despertou imediatamente a vontade de me drogar, eu queria experimentar LSD, comecei a procurar e a perguntar por alguém que vendesse a tal droga, mas nunca encontrei, pelo menos por lá. Dai em diante eu adotei a filosofia psicodélica e auto destrutiva de meu mestre; Jim.


   Bebia como um louco pra saber "o que havia do outro lado", e como não tinha drogas passe a inalar thinner(solvente para tintas) diariamente. Entrava no banheiro com uma estopa encharcada daquilo e quando saia não sabia nem aonde estava. E assim continuei, sempre progredindo na insanidade e irresponsabilidade. Descobri que um cara vendia maconha na rua de cima, então passei a fumar todos os dias.

   Com isso, todos que antes me admiravam por ser m rapaz trabalhador, levaram um susto quando foram vendo quem eu era de verdade, isso por que eu tinha aprendido com Jim a não esconder de ninguém que era louco. Como consequência,  a relação com o trabalho ficou totalmente comprometida, pois passei a beber durante o dia também e sempre com uma estopinha com thinner no bolso.

  Definitivamente eu havia perdido o juízo, vivendo numa imensa ilusão. Só que ainda não foi isso que me deu meu diploma de insanidade. O meu ato de loucura e irresponsabilidade maior, ficou por conta do que aconteceu na noite em que eu destruí de vez,  minha já manchada reputação naquele lugar.

  Até hoje eu não acredito que fui capaz de tamanha babaquice. Nesse caso estiveram envolvidos uma garrafa de conhaque, várias cervejas, um carro roubado e é claro, muita estupidez! 


   Enquanto isso...

  Olá  amigos, como vão todos? Hoje acordei pensando no enquanto isso de hoje e agora me dei conta de que há exatos dez anos atrás, eu estava vivendo o que acabo de postar.
            É incrível poder contar isso como se estivesse falando de outra pessoa, e na verdade estou. Não me orgulho de nada que estou contando, porém lembrar de tudo me deixa orgulhoso.
            Pelo simples fato de saber que aquela pessoa não era eu, eu estive lá, mas não pude ser quem eu sou.
            Hoje com a mente aberta, percebo o quão sofrida é a vida de quem não procura se conhecer de verdade. Assumir qualquer identidade para preencher o vazio de ser um completo estranho para si mesmo.
            Isso faz qualquer ser humano enlouquecer, nada pode nos preencher se não a mais clara convicção de quem realmente somos, do que verdadeiramente nos da prazer em ser e simplesmente sermos nós mesmos. Sem fugas!
            As drogas, todas eles, inclusive o álcool só encontram espaço em nossas vidas quando deixamos de praticar o exercício de entrarmos em contato com nosso íntimo, onde muitas vezes encontramos algo que não nos agrada, porém é também onde se encontra tudo aquilo que nos faz feliz.
            Hoje eu entendo que todas as respostas se encontram dentro de mim, e que fugir desse conflito só me afastará ainda mais da verdade.
            Só por hoje eu escuto a voz do meu coração. Obrigada a todos! Continuem Voltando!

2 comentários:

  1. ai amigo..kkkk..desculpa mais achei cômico a cena de vc querendo ser o Jim...rs...caraca que viagem..rs...eu tb as vezes me pego no passado, não sou adicta mas poderia vir a ser...kk já que eu tb vivia enchendo a cara...rs...a gente faz cada merda com umas pinga na cabeça...as pessoas tem razão qd dizem que Deus olha pelos bebados e pelas crianças....e olha o mau da humanidade e isso não é exclusivo de adictos, mais do mundo é buscar a tal felicidade onde jamais encontrarão..fora de si mesmas...bom dia

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  2. Heleno, Muito legal ver que você percebeu qual o caminho pra sua recuperação e claro para sua vida.
    Todos nós precisamos percorrer este caminho, mas para os adictos, sim é mais difícil, pois vivem na escravidão de outra maneira de sentir “ recompensa” , “ prazer ” ...
    Isso me dá ânimo em acreditar nas pessoas, ultimamente ando desacreditada em muitas coisas.
    Você consegue, tenho certeza disso.
    Força pra nós

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