A destruidora e letal diversão
No dia de ir até o local onde possivelmente eu seria preso, confesso que pensei em fugir, mas pra onde? Eu já estava em São Paulo, tecnicamente fugido, para onde eu iria desta vez? Não havia mais saída. Tive que encarar as consequências, pois fugir, para mais longe que fosse, não livraria de ser procurado pela polícia.
Então tomei
coragem e fui, durante todo o trajeto fiquei pensando no que falaria em minha
defesa, mas não havia explicação ou justificativa para ter feito aquilo. Assim que
cheguei lá fui direto falar com a dona do estacionamento e, quando ela me viu
começou a chorar e a dar graças a Deus que eu estava bem.
Ela me
perdoou e disse que acreditava em mim. também me fez prometer que nunca mais voltaria
a beber. Na rua, os vizinhos se alarmaram com a notícia de que eu estava de
volta, toda a vizinhança já sabia da história. Quando meu pai me viu sua reação
foi simplesmente balançar a cabeça, ele não quis nem
ouvir minha versão do que de fato tinha acontecido.
A
única coisa que ele me disse foi que eu podia esquecer meu pagamento por um bom
tempo, pois o prejuízo tinha sido enorme. Quanto ao dono do carro, quem eu
achava que iria voar no meu pescoço quando me visse, se apresentou solidário
comigo, disse que realmente não tinha ficado com raiva e sim preocupado com o
que poderia me acontecer.
Ele me deu
um bom sermão seguido de vários conselhos e me disse que estava tudo resolvido
ali mesmo. Depois me contou que a história de ter que dar explicações
para a polícia não era verdade, foi apenas uma forma de me fazer voltar lá e me
retratar com todos e, principalmente por que o mínimo que eu podia fazer era
trabalhar para pagar seu prejuízo.
E assim foi,
pelo menos desta vez eu corri da responsabilidade e, em pouco tempo paguei o
que ele havia gasto em peças e acessórios, já o concerto das várias batidas que
eu dei com o carro, fizemos lá mesmo na oficina. Paguei um preço alto pelo que
fiz, perder dois ou três pagamentos não foi nada, pior foi passar a ser evitado
por todos, era doloroso ver aqueles olhares de desprezo que todos tinham por
mim. Me sentia detestável!
E a indignação das pessoas aumentou ainda mais depois
que me viram bebendo novamente, pouco tempo depois daquilo tudo ter acontecido.
Era uma bola de neve que faria parte da minha vida ainda por muito tempo. Não
conseguia lidar com as consequências das minhas ações, a dolorosa realidade
pós cagadas me levavam diretamente para minha fuga; drogas, drogas e mais
drogas.
Contudo o
negócio do meu pai não ia nada bem, ele atribuía a quase total falta de
serviços ao que eu tinha feito,eu também achava que sim. Eu podia ser insano
mas não era burro, nem eu deixaria meu carro onde trabalhasse um marginalzinho
como eu e, infelizmente a minha fama tinha se espalhado rapidamente. Então em
menos de quatro meses depois tivemos que fechar as portas, não tínhamos
dinheiro para o aluguel.
Meu pai
levou todo o equipamento para a oficina de um amigo dele e passou a trabalhar
lá também. Alugou uma casinha pequena para nós dois dividirmos o aluguel,
enquanto eu passei a procurar emprego em outros lugares, por que o amigo de meu
pai jamais me daria trabalho. Cada vez mais perdido, não parei pra pensar que
talvez fosse hora de mudar de comportamento. Já faziam seis anos que usava
drogas e, nesse espaço de tempo só havia perdido tempo,dinheiro, saúde, amigos,
tudo, nenhuma conquista.
Mas essa é a
doença do ainda, da negação e, para mim as drogas não representavam nenhum
problema, eu pensava que as coisas negativas que aconteciam cada vez mais, se
tratava apenas de muita falta de sorte. Fiquei morando com meu pai até o que eu
achava que era falta de sorte começar a acontecer. Arranjei um trabalho em uma
oficina lá pelas redondezas, mas nada mudou. Em pouco tempo já conhecia todas
as bocas de fumo e traficantes da região.
E não
demorou muito para a situação em casa ficar insustentável,
as brigas eram constantes e, sempre pelo mesmo motivo, eu nunca chegava em casa
com a minha parte do aluguel como tínhamos combinado. Até que um dia , durante
uma dessas discussões, peguei minhas coisas e fui embora. Pedi ajuda a minha
tia (a mesma que eu fui me esconder na casa dela quando roubei o carro), pois
ela ainda não sabia muito bem o que eu andava fazendo, por isso deixou que eu
ficasse lá com a condição de arrumar logo um trabalho.
Quando ela
me perguntou por que eu não fiquei com meu pai, disse a ela que era por que ele
bebia todos os dias e eu já estava entrando nessa também, por isso precisava
sair de lá, pois queria parar de beber. O golpe de mestre de um bom adicto,
manipulador e mentiroso, me achava muito esperto, pobre de mim. Mas minha
máscara não duraria muito tempo, a obsessão pelas drogas só aumentava, enquanto
o auto-controle só diminuía.
Nessa época
meu primo andava com uma galerinha da pesada, eram grunges (culto a um estilo
de rock) fanáticos, alienados até os ossos, viviam para beber e se drogar ao
som de nirvana e, nada mais. E eu, adivinhem só? Obviamente, achei que
aquilo é que era viver, que era ser livre, rebeldia sem causa, o máximo. Passei
a andar com eles e em pouco tempo me tornei uma espécie de chefe do bando, pois
eu era o mais velho e mais louco também, eles vibravam com as minhas
insanidades, era patético.
Só andávamos
juntos, sempre com garrafas de bebida e drogas a tiracolo. No grupo, andava
também um amigo de meu primo chamado Thiago, fizemos uma amizade especial pelo
fato de sermos os únicos que tocavam violão. Passamos a compor músicas juntos,
sonhávamos em montar uma banda. Ele era muito jovem, tinha apenas dezesseis
anos, por isso era muito influenciado por mim, eu era seu ídolo.
Nosso point era
a represa do Guarapiranga que ficava próximo as nossas casas.
Íamos lá praticamente todos os dias, fazíamos fogueiras e ficávamos bebendo,
nos drogando e tocando nossos hinos sagrados de Nirvana e Pearl Jam.
Passávamos a madrugada inteira por lá, naquele lugar aconteceram as mais
inóspitas situações decorrentes dos efeitos das drogas que usávamos. E usávamos
de tudo, a onda era ficar o quanto mais louco possível e, meu apelido não
poderia deixar de ser outro, só me chamavam de Jim, às vezes de Cazuza também.
Vivíamos
numa eterna e alucinada viajem sem sentido, mas sem sentido nenhum, nunca vi
nada mais estúpido do que cheirar cola de sapateiro ou tomar várias cartelas de
remédios controlados com litros e litros de álcool. A diversão ali era dançar
com a morte a beira de um precipício. Viva ao Rock'inRoll!
Olá Heleno.
ResponderExcluirGosto da sua narrativa, espero que esta história de dor renda um bom livro que traga transformação na vida de muitos jovens.
Muita luz na caminhada. Que seja tranquila e em paz.