Riscos além da nossa própria imaginação
Era junho de 2004, eu havia completado vinte e dois anos, acho que quanto mais o tempo passava, mais eu estava me conformando com o que as drogas estavam fazendo comigo. É um processo lento e imperceptível (para o dependente químico), que pode levar anos ou apenas alguns meses, mas o fato é que aos poucos vamos nos moldando conforme a doença progride. E a única forma de se convencer de que destruir-se lentamente é uma escolha consciente é através da ilusão, da negação, do auto-engano, da prepotência e da arrogância. E foi exatamente assim que eu passei a agir, avesso à realidade.
Como se não fosse o bastante o que eu já andava aprontando, ainda fiz por
onde piorar mais ainda minha situação naquele lugar. Numa certa noite, como de
costume, eu e meu pai saímos para beber, e como sempre na hora de parar eu me
neguei, pra mim não tinha a menor graça parar de beber antes de começar a
cambalear e filosofar asneiras. Me lembro que nesse dia meu pai estava contente
com o resultado do trabalho da semana, por isso não se importou em me deixar lá
bebendo até mais tarde e foi embora.
Fiquei no mesmo bar um tempo e logo fui dar uma volta atrás de drogas,
perguntei pra um e pra outro, ninguém sabia de nada. Então lembrei da pista de
skate que ficava nas proximidades e fui até lá, sabia que seria possível
achar pelo menos maconha com os skatistas. Chegando lá encontrei apenas um cara
sentado fumando um cigarro, me aproximei, cumprimentei-o e fui logo ao assunto.
Perguntei-lhe se sabia onde eu pudesse comprar cocaína, ele disse que por ali
estava em falta, que nas redondezas era mais fácil achar maconha. Bingo! Como
eu suspeitava.
Não fiquei tão feliz assim como ficaria se a droga mais fácil de
encontrar fosse outra mas, tudo bem, disse eu, convidando-o a irmos buscar a
erva fumar comigo. O carinha até que era gente boa, tínhamos o mesmo gosto
musical em comum, por isso, assunto não nos faltou. No meio do caminho, para
onde compraríamos a erva, resolvemos comprar um a bebida para esquentar um
pouco, pois era madrugada e fazia um frio de rachar. Paramos em um
barzinho, compramos uma garrafa de conhaque e seguimos bebendo no gargalo pela
rua como eu adorava fazer, me sentia o próprio Jim.
Achamos o que fomos buscar e voltamos para a pista de skate, ficando por
lá até uma certa hora. Em um determinado momento eu disse a meu novo amigo
que estava com fome e, perguntei o que ele achava de dividirmos uma
pizza, ele concordou e então partimos em busca de uma pizzaria que
estivesse aberta. Não encontramos nenhuma por onde procuramos, foi quando me
lembrei que havia uma perto de onde eu morava e que funcionava 24 horas.
Fomos até lá, compramos nossa pizza e eu o convidei para irmos até a minha casa
(que era também a oficina) para comermos a pizza lá.
Foi ai que a confusão teve inicio, após a gente comer a pizza meu
coleguinha simplesmente apagou no sofá onde eu dormia, o cara pegou num sono
tão pesado que eu não consegui acordá-lo. Puto da vida, peguei a garrafa de
conhaque, entrei em um carro que estava lá dentro, liguei o som e fiquei lá,
bebendo e pensando no que eu ia falar para meu pai, quando ele acordasse e
encontrasse um sujeito que ele nunca viu dormindo na casa dele. Só que
infelizmente, meu pai não teria nem tempo de dormir até de manhã para ter
problemas, tudo por que eu matei a garrafa de conhaque, saí para comprar mais cerveja,
voltei, bebi todas as cervejas para então, ter a ideia mais estúpida do mundo;
"pegar um carro e sair sem rumo".
O que
fiz naquele dia foi uma das maiores insanidades que cometi até hoje, sem pensar
nas consequências comecei a executar um plano pra sair com um carro às tantas
da madrugada, e que é pior, o único carro que dava para eu pegar, era o que
estava de frente para o portão, pois para tirar qualquer outro eu teria que
tirar aquele primeiro. E esse carro não era de cliente da oficina, era um dos
carros que passavam a noite no estacionamento. Estava completamente embriagado,
mas me lembro de quase tudo, sabia que não poderia fazer nenhum barulho,
por que a senhora dona da casa tinha um sono bastante leve. Pé por pé, fui até
onde ficavam as chaves e peguei a correspondente ao carro que estava de frente
pra saída.
Era hora de ver no que ia dar, fui até o quarto onde meu pai dormia,
peguei uma grana dele, passei no salão onde o babaquinha tinha apagado pra ver
se ele acordara , como ainda estava dormindo eu teria de ir sozinho mesmo. E lá
fui eu, como sabia que o portão faria barulho ao soltar as correntes, primeiro
abri o carro pondo a chave no contato e deixando a porta entreaberta, onde o
carro estava era uma decida, então numa velocidade incrível eu abri o portão
fazendo um barulho enorme e, quando eu entrava no carro o filho da velha
apareceu na janela, ele não imaginava o que estava, mas soube depois do que me
viu fazer.
Com o
portão aberto eu entrei no carro, soltei o freio de mão deixando o carro descer
com tudo para o meio da rua, somente depois dei partida e saí cantando pneus.
Só me lembro de ouvir o cara gritando da janela; "O que é que você está
fazendo? onde você vai com esse carro? Já era tarde, sai a mil por hora
por que achei que ele viria atrás de mim. O pior foi que quando foram acordar
meu pai dizendo que eu tinha saído com um carro do estacionamento, ele foi até
onde eu dormia e viu o cara deitado lá e achou que era eu. Ai ele voltou até lá
fora e disse que devia ter sido um ladão por que eu estava dormindo.
Mas o
filho da velha disse que tinha certeza de que havia sido eu, eles então
começaram a discutir, meu dizendo que não era possível pois eu estava dormindo,
o cara insistindo que tinha certeza que era eu, virou uma confusão só. Meu pai
então não teve outra opção a não ser me acordar para todos verem que eu estava
lá. Foi aí que ninguém entendeu mais nada, quando meu pai acendeu a luz e se
aproximou do sofá quase caiu pra trás, Havia realmente alguém lá, mas aquele
não era o filho dele. O pior foi que nem o próprio cara que tinha dormido lá
sabia dizer o que estava fazendo ali, muito menos o que tinha acontecido em
relação ao carro. O imbecil nem sequer se lembrava do meu nome.
Botaram ele pra correr de lá debaixo de tapas, até hoje esse cara deve me
odiar pelo que eu fiz ele passar. Tudo isso que aconteceu, depois que fugi com
o carro, meu pai me contou quando eu voltei lá, obrigado, para pedir desculpas
pelo que fiz. Mas até eu ser encontrado, ou melhor, até o carro ser encontrado
o clima ficou tenso por lá. Eu rodei ate de manhã com o carro, estourei o pneu
e bati com ele várias vezes. Mas o pior de tudo ainda seria ter pego o carro sem
permissão, se eu não o tivesse abandonado sem saber dizer aonde depois.
Enquanto isso...
Olá queridos
amigos! Como vão todos? Enfim sexta-feira! É, eu costumava dizer com a maior
euforia na época da ativa, e hoje me vejo dizendo isso, nem tão eufórico, mas
super animado pois tenho vários motivos para estar feliz com o dia de hoje.
Primeiro que meu amor está subindo a serra hoje depois de uma semana longe um
do outro, para comemorarmos juntos esse mês de superações, tanto da minha
parte, pois faço trinta dias limpo amanhã, quanto da parte dela que está se
livrando de sua co-dependência aos poucos.
Me
deixar sozinho por um dia já era uma tortura para ela, imagina então uma
semana. E ela vem se mostrando valente e confiante pois tem conseguido não
ligar mais, de meia em meia hora. E eu por minha vez, faço exatamente tudo
conforme combinamos antes de ela descer para o Rio no início da semana.
Assim estamos tirando a minha adicção do nosso caminho de uma vez.
Restabelecer a confiança é um processo lento e delicado, isso em casos comuns,
no caso de voltar a confiar em um adicto o tempo tende a triplicar. E pelo que
posso perceber, pode levar anos até ela se sentir confiante novamente, mas nada
como um dia após.
O importante é que ultimamente, no final de cada dia, tudo termina bem,
quando nos despedimos a noite para dormir o que sentimos é que, de só por
hoje em só por hoje não sofreremos nunca mais, podemos deitar nossa cabeças no
travesseiro e dormir em paz.
Domingo eu faço trinta e dois anos de idade, e dessa vez eu tenho o que
comemorar, estou sentindo-me livre pela primeira vez depois de ter tomado
aquela primeira dose lá no início. Liberdade pra mim já foi poder fazer o que
eu queria e quando queria. Hoje percebi que liberdade não se alcança sem o
minimo de disciplina e comprometimento.
Quem
só faz aquilo que deseja é prisioneiro do egoísmo, do medo de descobrir
que não sabe tudo, da falta de coragem para correr riscos, da falta de
autenticidade, de que descubram suas fraquezas, da falta de sonhos.
Quem
só faz aquilo que quer e quando quer, não consegue sair do mesmo lugar por que,
tudo de bom que acontece em nossas vidas só acontece no seu tempo certo, não
podemos fazer com que elas aconteçam no quando sentimoS vontade.
Apenas se eu escolher o caminho que leva até meus sonhos, meus sonhos virão até
a mim. E nesse caminho preciso fazer apenas aquilo de que necessitam meus
sonhos, suas vontades, assim eles se entregarão a mim.
E é exatamente caminhar
na direção dos meus sonhos que me faz sentir-me livre, nada me satisfaz mais do
que poder enxergar a aproximação de um sonho em cada passo que dou, em cada
escolha que faço, não sou mais cego por satisfações imediatas.
Obrigado a todos! Mais um dia
livre , limpo e sereno!
Parabéns,tenho acompanhado se blog,desde que vi seu comentário no blog da Poly,como e bom saber que vc esta firme no seu proposito de se manter limpo,muito bom mesmo,continue firme,que Deus te ajude em todos os momentos,força,fé,vc vai vencer.Joseane.
ResponderExcluirOi Heleno. Bah, tenho que te dizer, essa sua história seria até engraçada se não fosse trágica. Eu tenho uma imaginação muito fértil e consigo imaginar toda a cena. Me peguei rindo aqui enquanto lia, porque é incrível o que vocês fazem sob o efeito das drogas, seja alcool, maconha, cocaína, o que for.
ResponderExcluirFico muito feliz por você, de verdade, pela sua força de vontade, e pela sua namorada também. Que Deus continue abençoando vocês nesse caminho. Só por hoje!
Abraço!